07/08/08
Em qualquer momento, no começo e no fim,
mesmo na medida de toda a vida - falhos de toda a pena,
permanecemos sem amanhã nem princípio,
esbatidos na idade e na distância, saqueados na sua mentira,
apenas acumulando areia para o fundo de um recreio
a simular um amuleto contra o regresso impossível.
Não temos trégua - não podemos voltar - e afastamo-nos - sem
ruído - lá para onde de longe chamamos, no ar rarefeito
- figuras resumidas a uma branca poeira informe,
em quantas inumeráveis semelhanças com a morte.
Pressentida ruína, a do íntimo declínio disto tudo,
demais cientes na incerteza como o sinal exposto da memória,
resina que nela se abate à frente dos olhos, que
esmaga cada braçada do tempo ao seu embuste
e nos recusa a menor separação do abandono -
que por nada existimos - e só acenamos - acenamos -
senão para crer no que julgamos não ter acontecido,
senão a entender a justa aceitação da nossa vida.
Rui Coias, poema 7 de "A Ordem do Mundo",
Ed. Quasi, 2005, p 15.