13/01/14



 
 
Não é difícil entender por que os psicopatas são atraídos para o crime de colarinho branco e se dão bem nesse nicho. Em primeiro lugar, há um monte de oportunidades rentáveis à mão. Como disse um dos sujeitos que entrevistámos, condenado por vender ações corporativas forjadas: "Eu não estaria na prisão se não houvesse tantos potes de biscoito implorando que eu enfiasse a mão dentro deles" (...)
Em segundo lugar, os psicopatas têm todas as ferramentas de que precisam para fraudar e enganar os outros: eles são convincentes, encantadores, seguros de si, hábeis em situações sociais, frios sob pressão, inteiramente implacáveis e não se intimidam com o risco de serem apanhados. Quando desmascarados, continuam a agir como se nada tivesse acontecido e, com frequência, deixam seus acusadores desnorteados e incertos a respeito de suas próprias posições.
Finalmente, o crime de colarinho branco é lucrativo, os riscos de os fraudadores serem descobertos são mínimos e as penalidades não costumam passar de triviais (...) Em muitos casos, as regras do jogo da ganância e da fraude colocadas em prática em grande escala não são as mesmas aplicadas ao crime comum. Com frequência, os jogadores da ganância e da fraude formam uma rede livremente estruturada para proteger seus interesses mútuos: eles são da mesma classe social, frequentaram as mesmas escolas, pertencem aos mesmos clubes (...).
É claro que a mentira e a manipulação patológicas não são exclusivas de psicopatas. O que torna os psicopatas diferentes dos outros é a incrível facilidade com que mentem, o alcance de sua fraude e a frieza com que colocam seus planos em prática.
No entanto, há algo mais, igualmente intrigante, no discuro dos psicopatas: eles costumam usar declarações contraditórias e logicamente inconsistentes que, em geral, passam despercebidas. Pesquisas recentes sobre a linguagem dos psicopatas fornecem algumas pistas importantes para a solução desse quebra-cabeça e também servem para explicar sua fantástica habilidade de manipular palavras - e pessoas - com tanta facilidade (...).
Essas observações clínicas tocam no ponto crítico do mistério da psicopatia: a linguagem de duas dimensões, sem profundidade emocional.
Uma analogia simples pode ajudar. O psicopata é como uma pessoa que não enxerga cores, que vê o mundo em sombras cinzentas, mas que aprendeu como deve agir no mundo colorido (...) o psicopata não tem um elemento importante da experiência: nesse caso, o aspecto emocional, mas consegue aprender as palavras que os outros usam e, assim, é capaz de descrever ou de imitar experiências que na verdade não consegue entender. Como coloca Cleckley: "Ele pode aprender a usar pralavras comuns... e também aprende a reproduzir de modo apropriado os gestos, as expressões faciais e os movimentos do sentimento... mas não experimenta o sentimento real."
 
 
 
   Hare, Robert D. . Sem Consciência, o mundo perturbador dos psicopatas que vivem entre nós. Porto Alegre: Artmed, 2013, pp 130 - 137.
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