11/06/08


           "  Texto  17  "


A vida. A vida é muito útil: serve para fingir que sabemos
muita coisa, para fingir que gostamos dos outros, para fingir
que somos alguém não o sendo e para querer ter muito
poder. Eu, umas vezes, ponho a vida a tiracolo, para que as
suas franjas arrojem o chão; outras, coloco-a à cabeça, e logo
ela parece querer voar alçando-se ao céu. Certo dia pus a
vida numa capoeira que tenho lá no quintal, mas ela, assim
que se viu presa, começou a uivar no seu poleiro pedindo-me
para que a libertasse, e eu libertei-a mesmo... só que ela,
desorientada, ao atravessar uma rua, foi logo atropelada.
Ainda pensei arranjar outra vida, mas depois vi que não
valia a pena...

   Mateus, Victor Oliveira. Movimento de Ninguém. Lisboa: Minerva, 1999, p 29.
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