"Quando ninguém olhava"
.
.
Passava os dias iluminado por uma janela
Esperando os dias seguintes
Escoando memórias inquietas
Esvaziando contornos de feridas
Abertas, sem horas nem promessas
No sossego
Quando ninguém estava a olhar.
.
Custava viver emparedado no teu silêncio
Devassado de ambições e chama
De olhos abertos, adormecidos sem lágrimas
Com as mãos mordidas, em sangue
Presas violentamente na parede.
.
Percorrer a vida no meu rasto
Pisando as minhas pegadas
Respirando os mesmos minutos
Sem trabalhos de monta
Que tudo o mais daria muito trabalho
Como falar
Como sonhar
Como inventar
Como vivermos com pressa de viver.
.
Quando ninguém olhava
Deixei de te ver
Respirei os meus minutos sozinho
Iluminado por uma janela
À beira do mundo, começando outra vez.
.
.
Daniel Costa-Lourenço, In "Furor das Noites Cheias",
Edições EC, s/cidade, 2008 (?), pp 69-70.