29/12/11

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As divisões Lobisomem foram uma das ideias mais desesperadas de Himmler, forjada perante a derrota iminente. Rumores da sua existência tinham-se espalhado pela Alemanha e fora dela. Os serviços secretos aliados estavam convencidos de que pelotões especiais de insurgentes, fanáticos incapazes de aceitar a derrota, estavam de facto a ser criados para continuarem a luta depois da capitulação da Alemanha.
(...) Esta foi a marca da guerra de Bruno: oferecer-se como voluntário para ser um Lobisomem e lutar até ao fim, se não para além do fim. Parecia tudo muito adequado. O homem que tinha aderido ao movimento na primeira oportunidade, ainda adolescente, há mais de 20 anos, alistara-se no última tentativa desesperada do Terceiro Reich para sair do túmulo do colapso militar total. A sua carreira nazi ia acabar, como começara, com um compromisso ideológico inabalável, absolutamente nada perturbado com o facto de que, em termos militares, ele estava completamente fora do seu elemento. A ideia de que bandos minúsculos de guerrilheiros alemães poderiam ter algum impacto numa força aliada que ascendia a milhões, com rádios que nem sequer ele, o homem que devia ministrar o treino, sabia bem como funcionavam, era ridícula. Mas é uma imagem profundamente reveladora do tipo de homem que Bruno sempre tinha sido. Se havia algum sinal de uma luta na sua mente entre as prioridades concorrentes de manter a família em segurança e prolongar a existência do regime nazi, mesmo que apenas durante algumas semanas, foi óbvio o que pareceu levar a melhor. Mas até Bruno e os seus colegas do SD/ Gestapo devem ter sentido a onda de ódio e vingança que se aproximava.
Enquanto Bruno e os seus colegas do SD/ Gestapo maquinaram os seus planos de contrainsurgência, o resto da cidade de Praga também estava ocupada a construir valas antitanques e a pensar na melhor forma de lutar contra o que até eles sabiam que seria batalha final da guerra (...)
Em meados de Abril, Frank distribuiu planos de avacuação a todo o seu pessoal alemão essencial, parecendo dessa forma colocar a ideia do Lobisomem em espera. Foi uma mudança de estratégia que parece também ter tido um impacto em Bruno. Guardado nos arquivos de Praga, encontrámos um documento bizarro datado de 24 de abril de 1945. Era um formulário de pedido de carta de condução. Muito bem preenchido, ali estava ele, a irradiar normalidade em todos os aspectos exceto na data - pouco mais de 15 dias antes da capitulação formal do exército alemão. Quanto mais olhava para ele, mais absurdo me parecia, a prova de um mundo voltado de pernas para o ar. Como podia alguém dar-se ao trabalho de seguir os trâmites burocráticos necessários para validar uma carta de condução neste ponto final e fatal da guerra, com todo o exército vermelho a alguns quilómetros de distância? E, no entanto, tudo está presente e correto, a rubrica, os carimbos de borracha, as categorias dactilografadas de veículos que Bruno podia conduzir, até o nome da escola de condução que o tinha aprovado. (...) Penso que, nos dias seguintes, um alemão na estrada teria necessitado de carta de condução para evitar ser acusado de deserção. Nunca saberei. No entanto, quando olhei para a assinatura no verso não pude deixar de perguntar a mim mesmo em que estaria ele a pensar num momento como aquele.
(...) No dia 30 de Abril, Adolf Hitler refletiu sobre o seu encontro iminente com exército vermelho e escolheu uma rota de fuga alternativa: cerca das 15 horas, na segurança do seu abrigo subterrâneo por baixo da Chancelaria do Reich, suicidou-se com um tiro. Incrivelmente, nesta fase tardia ainda havia bastante "normalidade" em Praga, para que o acontecimento fosse assinalado nas primeiras páginas dos jornais em língua checa com faixas pretas de luto. Mas a compostura alemã estava a desmoronar rapidamente.
No dia seguinte, 1 de maio de 1945, a Primeira Frente Ucraniana do marechal Koniev que estava nos arredores de Berlim recebeu ordens para se dirigir para oeste de Dresden, seguindo o rio Vltava até Praga. No dia 2 de maio, a Segunda Frente Ucraniana do marechal Malinovski, que acabara de ocupar Brno, recebeu ordens para avançar para Praga a partir do sudeste. A ofensiva soviética começaria a 7 de maio e ocuparia a capital checa dentro de seis dias (...)
Protegidos pelos soviéticos, cujos tanques estavam agora nos arredores da cidade, os checos puderam por fim revoltar-se contra os seus opressores nazis.

  Martin Davidson in " O Perfeito Nazi ", Texto Editores, Alfragide, 2011, pp 284 - 288.
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