A. C. Swinburne - numa aguarela, de 1862, de Dante Gabriel Rossetti.
(Algernon Charles Swinburne - 5/4/1837 - 10/4/1909 )
ANACTORIA
My life is bitter with thy love; thine eyes
Blind me, Thy Tresses burn me, Thy sharp sights
Divide my flesh and spirit with soft sound,
And my blood strengthens, andmy veins abound.
I pray thee sigh not, speak not, draw not breath;
Let life burn down, and dream it is not death.
I would the sea had hidden us, the fire
(Wilt thou fear that, and fear not my desire?)
Severede the bones that bleach, the flesh that cleaves,
And let our sifted ashes drop like leaves.
I feel thy blood against my bloof: my pain
Pains thee, and lips bruise lips, and vein stings vein.
Let fruit be crushed on fruit, let flower on flower,
Breast kindle breast, and either burn one hour.
Why wilt thou follow lesser loves? are thine
Too weak to bear these hands and lips of mine?
I charge thee for my life's sake. O too sweet
To crush love with thy cruel faultless feet,
I charge thee keep thy lips from hers or his,
Sweetest, till theirs be sweeter than my kiss:
Lest I too lure, a swallow for a dove,
Erotion or Erinna to my love.
I would my love could kill thee; I am satiated
With seeing thee live, and fain would have thee dead.
I would earth had thy body as fruit to eat,
And no mouth but some serpent's found thee sweet.
I would find gievous ways to have thee slain,
Intense device, and superflux of pain;
Vex thee with amorous agonies, and shake
Life at thy lips, and leave it there to ache;
Strain out thy soul with pangs too soft to kill,
Intolerable interludes, and infinite ill;
Relapse and reluction of the breath,
Dumb tunes and shuddering semitones of death.
I am weary of all thy words and soft strange ways,
Of all love's fiery nights and all his days,
An all the broken kisses salt as brine
That shuddering lips make moist with waterish wine,
And eyes the bluer for all those hidden hours
That pleasure fills with tears and feeds from flowers,
Fierce at the heart with fire that half comes through,
But all the flower-like white stained round with blue;
The fervent underlid, and that above
Lifted with laughter or abashed with love;
... ... ...
.
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. Tradução para português de Maria de Lourdes Guimarães:
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ANACTORIA ( excerto)
A minha vida torna-se amarga com o teu amor; os teus olhos
Cegam-me, as tuas tranças queimam-me, os teus suspiros profundos
Dividem a minha carne e o meu espírito com um débil som,
E o meu sangue fortalece-se, e as minhas veias transbordam.
Peço-te que não suspires, não fales, não respires;
Deixa que a vida se reduza a cinzas e sonha que não é a morte.
Queria que o mar nos tivesse escondido, o fogo
(Terás tu medo disso e não receias o meu desejo?)
Quebrou os ossos que branqueiam, a carne que se fende,
E deixa que as nossas cinzas joeiradas caiam como folhas.
Sinto o teu sangue contra a meu; a minha dor
Atormenta-te, e os lábios esmagam os lábios, a veia dilacera a veia.
Que o fruto seja esmagado sobre o fruto, e a flor sobre a flor,
Que o seio desperte o seio e ambos ardam uma hora.
Por que hás-de tu seguir um amor sem importância? É o teu
Demasiado fraco para sustentar estas minhas mãos e estes meus lábios?
Exorto-te a que apenas por mim, ó tão amada,
Esmagues o amor com os teus belos pés cheios de crueldade,
Exorto-te a que afastes os teus lábios dos dela ou dos lábios dele,
Tão doces, até que eles sejam mais doces que o meu beijo:
Para que assim eu não atraia, uma andorinha em vez de uma pomba,
Erotion ou Erinna para o meu amor.
Quem me dera que o meu amor te matasse; fico saciada
Vendo os vivos e de bom grado te queria morta.
Quem me dera que a terra tivesse o teu corpo como fruto para comer,
E que nenhuma boca a não ser a de uma serpente te achasse doce.
Quem me dera encontrar maneiras cruéis de te mandar matar,
Instrumentos violentos e um excessivo fluxo de dor;
Atormentar-te com agonias amorosas e ameaçar
A vida nos teus lábios e deixá-la aí para doer;
Retirar-te a alma com agonias demasiado suaves para matar,
Interlúdios intoleráveis e infinito mal;
Provocar reincidência e relutância do alento,
Melodias mudas e trémulos murmúrios da morte.
Estou cansada de todas as tuas palavras e da tua estranha afabilidade,
De todas as noites escaldantes de amor e de todos os seus dias,
E de todos os beijos interrompidos, salgados como espuma,
Que lábios trémulos tornam húmidos com um vinho mais leve,
E olhos mais azuis por todas aquelas horas escondidas
Que o prazer enche de lágrimas e alimenta de flores,
Cruel fogo no coração que principia a penetrá-lo,
Mas deixando uma brancura de flor manchada à volta de azul;
A pálpebra inferior ardente, e a superior
Erguida com um sorriso ou confundida com o amor;
A. C. Swinburne, Poemas, Relógio D'Água Editores,
Lisboa, 2006, pp 36-39.
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30/11/08
25/11/08
"Veneza, O Grande Canal" - quadro de Turner.
"As ruínas" (Poema I)
Quis um dia essa tarefa, a de projectar ruínas:
de começar uma coisa
como uma coisa termina.
Imaginou-as plantadas, como harpas, numa planície.
Vizinhas a coisa alguma, pois, se a alguma vizinhas,
dela se entranham as ruínas.
E repetiu essa palavra, em tantas línguas traduduziu-a,
até suspeitar-lhe a sombra, até dilatar-lhe os sinos,
até descobrir-lhe arestas, ordens, cicatrizes, até que, dentro da palavra,
soassem guerras suspensas, houvesse incêndios antigos.
Até que, dentro da palavra, a própria coisa ruísse.
E imaginou essa palavra mais do que a coisa em ruína.
E imaginou-a palavra depois de a coisa finda.
E imaginou-a num deserto, mais soprada do que erguida.
Queria suas ruínas inecessárias, daninhas,
a que os gatos viessem por um quase humano instinto.
Onde as sombras florescessem como florescem espinhos.
Cláudio Neves, In "De Sombras e Vilas", Ed. 7 Letras,
Rio de Janeiro, 2008, p 65.
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"As ruínas" (Poema I)
Quis um dia essa tarefa, a de projectar ruínas:
de começar uma coisa
como uma coisa termina.
Imaginou-as plantadas, como harpas, numa planície.
Vizinhas a coisa alguma, pois, se a alguma vizinhas,
dela se entranham as ruínas.
E repetiu essa palavra, em tantas línguas traduduziu-a,
até suspeitar-lhe a sombra, até dilatar-lhe os sinos,
até descobrir-lhe arestas, ordens, cicatrizes, até que, dentro da palavra,
soassem guerras suspensas, houvesse incêndios antigos.
Até que, dentro da palavra, a própria coisa ruísse.
E imaginou essa palavra mais do que a coisa em ruína.
E imaginou-a palavra depois de a coisa finda.
E imaginou-a num deserto, mais soprada do que erguida.
Queria suas ruínas inecessárias, daninhas,
a que os gatos viessem por um quase humano instinto.
Onde as sombras florescessem como florescem espinhos.
Cláudio Neves, In "De Sombras e Vilas", Ed. 7 Letras,
Rio de Janeiro, 2008, p 65.
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22/11/08
Imagem do filme "Bilitis" de David Hamilton
" Nocturno de verão"
Havia o verão, o medo de um círculo
fechando-se em torno de nós.
Cada sentimento era somente
a pobre descrição de uma
imagem. Descia a luz sobre nós,
e em nós se repetia o rumor das cicadas,
o milagre das casas muradas
a toda a possibilidade delinquente.
"Não persigas o limite", disse-te.
"Qual o lado interior da fronteira,
este em que segues, ou o que nos
espera do outro lado? Do interior
virá o erro e o precipício: portões
electrificados e, sem que dês conta,
cães farejando a má-sorte de incautos."
Havia o verão e as cicadas e o perigo
de nos perdermos numa cidade hostil.
Luís Quintais, In "Angst", Edições Cotovia,
Lisboa, 2002, p 48.
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" Nocturno de verão"
Havia o verão, o medo de um círculo
fechando-se em torno de nós.
Cada sentimento era somente
a pobre descrição de uma
imagem. Descia a luz sobre nós,
e em nós se repetia o rumor das cicadas,
o milagre das casas muradas
a toda a possibilidade delinquente.
"Não persigas o limite", disse-te.
"Qual o lado interior da fronteira,
este em que segues, ou o que nos
espera do outro lado? Do interior
virá o erro e o precipício: portões
electrificados e, sem que dês conta,
cães farejando a má-sorte de incautos."
Havia o verão e as cicadas e o perigo
de nos perdermos numa cidade hostil.
Luís Quintais, In "Angst", Edições Cotovia,
Lisboa, 2002, p 48.
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21/11/08
Sulcas-me o corpo
com relevos mil. Cercas-me
o olhar de alarmes
e brandura. Lavras-me
a alma com brilhos
e resplendor. De ti
nada sei, ó infrene duração
das coisas! Nada sei,
a não ser a clara razão
com que talhas o mínimo
acidente. Sulcas-me.
Sorves o que a teus pés insisto
e ponho. E se tudo
tudo me levares, deixa-me
ao menos a ousadia do sonho.
Victor Oliveira Mateus, In "Revista de Poesia Saudade", Nº 10,
Junho, 2008, p 58.
(Nota - esta revista tinha por tema " O tempo")
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06/11/08
Em Lefteris é que eu me quero. No colorido vário
da sua pequena praia. No seu ar selvagem a concordar
contigo, quando esfarelas as folhas do tabaco
e, alheadamente, as misturas com o que sempre
compras no agitado mercado de Potamos.
Ágios Lefteris, escreves tu, com uma navalha,
numa das tábuas do chão, debaixo do alpendre.
A mesma com que em mim, náufrago a intuir caminhos
jamais representáveis, também escreves sentires
de que não falamos. Ou então é de nós que traças
breve e rigoroso esboço. Desta nossa vocação translúcida
para apascentar palavras, que, devendo ser sagradas,
tantas vezes atraiçoamos na espinhosa gramática
dos afectos. Com um graveto remexes os seixos
junto à linha d'água e o silêncio é uma planície
súbita e felinamente apanhada pelo desejo. O desejo.
Não o cego impulso sem fonte nem direcção, mas
essa infinda avidez de ser o outro, como coisa nossa
que nos prolonga e individua, bem longe do ser
gratuito, que, divisa deste tempo, a tantos mata
de vida sem contornos nem alimento. O desejo.
O pulsar-me das veias ao despique com o comedido
desgoverno da alma. O agradável tormento de nós
ante a imensidão do mar e o esmorecer do sol
(só em Lefteris há um pôr-do-sol assim!),
enquanto o teu galgo corpo galga galhardamente a casa
e, ridente e rígido, ressurge com a luminosa voz
de Angélica Ionatos por detrás: Lygmos Aggelon.
Uma canção que fala do transido soluçar dos anjos.
Uma canção que fala desses soluços, desse pretexto
para que soltemos nossos pássaros e com eles cantemos
debaixo das janelas que insistem em fechar-se-nos.
É em Lefteris que eu me quero, decididamente!
Lugar do mais admirável deslumbramento, dos mais
inexprimíveis sinais em mim atento e despojado.
Mas, entretanto, enquanto o tempo ainda é e não resiste,
tu, que estás e me seduzes, põe de novo a canção
que fala dos soluços dos anjos, a irressitível voz
de Ionatos, e, com teus decididos gestos, abre-me
com doçura a janela, o corpo, a morte pressentida.
Mateus, Victor Oliveira. A Irresistível Voz de Ionatos. Fafe: Editora Labirinto, 2009, pp 15 - 16.
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DIAMANDA GALÁS, 2006
O amor é velho, senta-se
no escuro, prefere não saber
a medida do tempo. Um tempo
que nos encontrava vestidos
de nenhuma cor, partilhando
charros a desoras. O amor?
Talvez nem sequer fizesse
parte do nosso vocabulário.
Mas apenas ele nos chama,
às vezes, para tão perto
de nada. E aceitamos, claro,
essas mãos vazias, um grito
que consiga prolongar a noite.
Perdeu-se, no entanto,
a emoção. Só não me digas,
Benilde, que se fechou
para sempre a última porta.
Manuel de Freitas, In "Jukebox 2",
Teatro de Vila Real, 2008, p 13.
.
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________________________________
a Victor Oliveira Mateus
.
Não sei se me perdi
ou sempre estive perdido
se estive perdido sempre
nunca me perdi
Mas que diferença existe
em estar perdido
ou não?
Sabemos acaso o que é estar perdido
ou não estar?
De qualquer modo a poesia
é uma forma de nos perdermos
sem nos perdermos
Se é tudo perda não há encontro
ou só existe o encontro na perda
inseparavelmente
Não se pode determinar nada
porque o fundo de tudo é indeterminado
e a evidência de tudo o que vemos
é inexplicável
António Ramos Rosa, In " O sol é todo o espaço",
Editorial Escritor, Lisboa, 2002, p 57.
.
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a Victor Oliveira Mateus
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Não sei se me perdi
ou sempre estive perdido
se estive perdido sempre
nunca me perdi
Mas que diferença existe
em estar perdido
ou não?
Sabemos acaso o que é estar perdido
ou não estar?
De qualquer modo a poesia
é uma forma de nos perdermos
sem nos perdermos
Se é tudo perda não há encontro
ou só existe o encontro na perda
inseparavelmente
Não se pode determinar nada
porque o fundo de tudo é indeterminado
e a evidência de tudo o que vemos
é inexplicável
António Ramos Rosa, In " O sol é todo o espaço",
Editorial Escritor, Lisboa, 2002, p 57.
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a Victor Oliveira Mateus
Tua voz no lacerar
irreparável da tarde,
é como um gesto que arde
no fogo lento do canto...
Asa de sonho a voar
nos lampejos dos sentidos
a murmurar aos ouvidos
as sombras do nosso encanto.
Pela luz que vem das formas
é que a palavra se veste
e o eco se torna agreste
ao deslizar na colina...
Que a luz quando se entorna
queima o lugar onde escorre,
até que se cansa e morre
quando o poema termina.
Com navalhas de cristal
te dilaceram o pranto
dos cilícios do espanto
que a toada mortifica...
Na esperança dum sinal
da voz do canto das águas
colhe das pedras das mágoas
a mágoa que lá não fica.
Do eu de ti tão distante
fica-te a alma que sobra
sem ter limite nem hora
por onde a ideia se tece...
É como a brisa ondulante
que leva o verso sem tempo,
escrito em folhas de vento
quando o poema acontece.
Poeta da essência pura
varre o pó das coisas velhas
no desconforto das telhas
no abrigo do momento...
Levas contigo a ternura
por onde a noite tem voz
quando cantas para nós
o que a voz leva por dentro!
Ulisses Duarte, In "Poetaneamente", Ed. Os retratados,
s/c, Out. 2008, p 62.
(Nota - Há 3/4 anos falei, pela última vez, com o poeta
Ulisses Duarte. Percebi então que era seu intento escrever
um livro onde se retratassem alguns autores. Fui colhido
este ano pela notícia da sua morte, mas nunca me ocorreu
que ele tivesse "deixado na gaveta" o meu retrato junto a
tantos outros. Numa toada clássica o Ulisses usa pedaços
de versos meus muito antigos - em itálico - para compor
o modo como me via. Foi com profunda comoção que vi
hoje este livro...)
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a Victor Oliveira Mateus
Tua voz no lacerar
irreparável da tarde,
é como um gesto que arde
no fogo lento do canto...
Asa de sonho a voar
nos lampejos dos sentidos
a murmurar aos ouvidos
as sombras do nosso encanto.
Pela luz que vem das formas
é que a palavra se veste
e o eco se torna agreste
ao deslizar na colina...
Que a luz quando se entorna
queima o lugar onde escorre,
até que se cansa e morre
quando o poema termina.
Com navalhas de cristal
te dilaceram o pranto
dos cilícios do espanto
que a toada mortifica...
Na esperança dum sinal
da voz do canto das águas
colhe das pedras das mágoas
a mágoa que lá não fica.
Do eu de ti tão distante
fica-te a alma que sobra
sem ter limite nem hora
por onde a ideia se tece...
É como a brisa ondulante
que leva o verso sem tempo,
escrito em folhas de vento
quando o poema acontece.
Poeta da essência pura
varre o pó das coisas velhas
no desconforto das telhas
no abrigo do momento...
Levas contigo a ternura
por onde a noite tem voz
quando cantas para nós
o que a voz leva por dentro!
Ulisses Duarte, In "Poetaneamente", Ed. Os retratados,
s/c, Out. 2008, p 62.
(Nota - Há 3/4 anos falei, pela última vez, com o poeta
Ulisses Duarte. Percebi então que era seu intento escrever
um livro onde se retratassem alguns autores. Fui colhido
este ano pela notícia da sua morte, mas nunca me ocorreu
que ele tivesse "deixado na gaveta" o meu retrato junto a
tantos outros. Numa toada clássica o Ulisses usa pedaços
de versos meus muito antigos - em itálico - para compor
o modo como me via. Foi com profunda comoção que vi
hoje este livro...)
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03/11/08
Naquele distante julho nada me impedia de ir para o
norte de África Arzila talvez
onde terminaria por cumprir a minha pena
uma espécie de equivalente a grilhetas como as que vi
uma vez
em Setúbal nuns pobres marinheiros.
Naquele café naquele distante julho
era uma absurdo falar da eternidade.
O gelado de baunilha sabia a vinho doce e eu era
um conquistador irresistível no meu casaco de linho azul e
uma dessas camisolas de lã com botões para apertar a gola.
Na esplanada perto do porto naquele distante julho
o meu conhecido na véspera o meu amigo
pouco dizia voltando a cerveja entre os dedos
no fato de gabardine cinzenta e camisa que me não lembro. Quem
viria?
Quem viria? E o hotel era tão velho
e tinha uma reputação tão má
que nem mesmo tinha nome.
Não passava de uma pensão barata e antiga. Quem viria?
Naquele distante julho o seu cabelo flutuava e o seu perfil
que dentro de alguns anos estaria velho
era agora nítido, uma moeda nova.
João Miguel Fernandes Jorge, Obra Poética - Volume 2,
Editorial Presença, Lisboa, 1987, p 66.
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norte de África Arzila talvez
onde terminaria por cumprir a minha pena
uma espécie de equivalente a grilhetas como as que vi
uma vez
em Setúbal nuns pobres marinheiros.
Naquele café naquele distante julho
era uma absurdo falar da eternidade.
O gelado de baunilha sabia a vinho doce e eu era
um conquistador irresistível no meu casaco de linho azul e
uma dessas camisolas de lã com botões para apertar a gola.
Na esplanada perto do porto naquele distante julho
o meu conhecido na véspera o meu amigo
pouco dizia voltando a cerveja entre os dedos
no fato de gabardine cinzenta e camisa que me não lembro. Quem
viria?
Quem viria? E o hotel era tão velho
e tinha uma reputação tão má
que nem mesmo tinha nome.
Não passava de uma pensão barata e antiga. Quem viria?
Naquele distante julho o seu cabelo flutuava e o seu perfil
que dentro de alguns anos estaria velho
era agora nítido, uma moeda nova.
João Miguel Fernandes Jorge, Obra Poética - Volume 2,
Editorial Presença, Lisboa, 1987, p 66.
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