03/11/08

Naquele distante julho nada me impedia de ir para o
norte de África Arzila talvez
onde terminaria por cumprir a minha pena
uma espécie de equivalente a grilhetas como as que vi
uma vez
em Setúbal nuns pobres marinheiros.
Naquele café naquele distante julho
era uma absurdo falar da eternidade.
O gelado de baunilha sabia a vinho doce e eu era
um conquistador irresistível no meu casaco de linho azul e
uma dessas camisolas de lã com botões para apertar a gola.
Na esplanada perto do porto naquele distante julho
o meu conhecido na véspera o meu amigo
pouco dizia voltando a cerveja entre os dedos
no fato de gabardine cinzenta e camisa que me não lembro. Quem
viria?
Quem viria? E o hotel era tão velho
e tinha uma reputação tão má
que nem mesmo tinha nome.
Não passava de uma pensão barata e antiga. Quem viria?

Naquele distante julho o seu cabelo flutuava e o seu perfil
que dentro de alguns anos estaria velho
era agora nítido, uma moeda nova.

João Miguel Fernandes Jorge, Obra Poética - Volume 2,
Editorial Presença, Lisboa, 1987, p 66.
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