29/07/09

"Agora, há ruído/ além do vento."


Nota - Enquanto aguardamos o lançamento do livro da Maiara Gouveia, que, julgo, está para breve, segue um inédito seu de um outro projecto. Gostei muito deste poema e ela autorizou-me a publicá-lo, portanto ...
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"Da origem "
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1.
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Aquém da intriga, a face, ainda oculta
por água turva, em plena queda,
mistura-se ao vácuo, abertura
de uma era. E a treva, armadilha, rodeia
este nada recém descoberto.
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Do oco, um lume revela
o barulho da pedra, esse sopro
a rolar sobre a esfera,
agora líquida, translúcida, repleta
de infinito.
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O firmamento divide o tempo
em duas águas. O árido
insurge, é a forma do corpo,
ainda inerte. No entanto,
um vapor cobre tudo, e brota o fruto
e a erva. Da noite, a lua e as guelras
têm poder. E da manhã, a matéria
forma o astro, o fervilhar, de onde,
num vôo ou mergulho, os seres
retiram potência e à vida
chegam.
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Do ovo, a serpente quebra
a superfície, e a pele fria
toca o solo, à espreita
do mistério. O homem,
da lama se desprende, e sem medo
existe até que o desejo
penetre em seus poros.
Agora, há ruído
além do vento.
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Do sono, a costela
expele a fêmea, de onde vem
a dor que tudo alimenta.
A história sela o destino
de ser. Esse deus
corpóreo, o cancro da fera,
com a presa na boca
e porque a fome o deseja. E desaba
um cortejo
de vozes, o cheiro
de banha e sangue
pisado. No centro, a raiz
expande a morte.
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Sabemos?
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Maiara Gouveia (Inédito)
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