05/07/09


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Quem me teria enviado esta foto? Quem me inundou
assim o P.C., que pretendia branco e limpo de qualquer
mágoa? De quem este retumbante e perverso intento
a revolver-me o pântano da memória? Porquê um anexo
a inundar-me o ecrã e a desafiar o esquecimento, que era
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já coisa certa e bem minha? Porquê a tua figura de novo,
aqui, bem na minha frente, com o nome do aeroporto
por detrás, as malas, a mochila a escorregar, os cabelos
- que naquela altura tinhas deixado crescer - quase
a tocarem o azul da camisola e o teu sorriso infantil,
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que ambos sabemos a quem se destinava? Terrível esta
alegoria da vida: as chegadas com o iníquo sabor da partida,
a bagagem aparentemente cheia no periclitante embarque
de nada, os sorrisos frágeis e efémeros, a quotidiana fuga
a cercear o que para ti tão raro quisera. Mas... quem me
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teria enviado esta foto? Esta virtual lembrança,
que nenhum antivírus impedirá agora de se tornear real,
obsessiva até? Através da janela nem uma resposta sequer.
Apenas o ecrã do céu - igualmente belo, igualmente azul.
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Victor Oliveira Mateus In "Revista de Poesia Saudade" Nº 11,
Junho, 2009, p 59.