25/08/09




"Eu Me Deleto"
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1
Eu me dilato:
rejeito a vida prêt-à-porter de massa e consumismo
fujo da matriz, evito o invólucro que me oferece como outro:
umbigo-conexão em fôrma e forma de fora para dentro
formulo e me reformulo
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mas estou infectado pelo vírus
electrônico, invadido por hackers de plantão
eliminando minha individualidade
- inteligência destrutiva
viral, virtual, visceral, vital.
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Me estendo, me simulo e dissimulo:
continuo sendo dionisíaco, lúdico
com o complexo de Narciso:
e me excomungo, me abduzo, me exorcizo.
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Como tudo é instantâneo
nem reflito
- espelho a derrocar a própria imagem.
Sou um rito de passagem.
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2
Eu me delato:
tudo pela onipresença
pela ubiquidade absoluta
- eu-prótese, eu-extensão
do modo de acomodar e conjugar
os mitos e as alegorias.
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3
E me deleto:
atrelado à rede total que me esgarça, me dispersa.
Me desloco, descolo, me desintegro, me desconecto.
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Estou cada vez mais fuso, parafuso, confuso
num esquema difuso
pelas regras da nanotecnologia
- daí a minha tecnofobia, minha agonia.
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É mesmo o fim da ideologia?
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Na missa virtual
em vez da pomba da paz
aparece uma vagina cósmica
denunciando minha origem.
Onde o antivírus? Cadê a vacina?
Vertigem do ser.
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Antonio Miranda In "Despertar das Águas", Thesaurus Editora,
Brasília, 2006, pp 74 - 76.
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