No tempo bordarei a minha dor
no tempo (esse tapete) bordarei
o tempo que não passa e que passei
fiando e desfiando por amor.
No tempo estas perguntas: onde e quando?
No tempo que se vai e não me leva
àquele por quem sou rainha e serva
fiando por amor e desfiando.
No tempo que se vai e se repete
no tempo bordarei o meu tapete
num fazer-desfazer que me desfaz.
Enquanto o tempo vai e não me leva
enquanto o tempo passa e não me traz
aquele por quem sou rainha e serva.
Manuel Alegre in " 30 Anos de Poesia", Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1997, pp 283 - 284.
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Nota - Este soneto é parte das falas de Penélope no livro de Manuel Alegre "Um barco para Ítaca" (1971), livro esse depois incluído nesta Antologia. Uma curiosidade: a Ditadura estava de tal modo podre, que a primeira vez que li "Um barco para Ítaca" cumpria eu o serviço militar e a obra circulava por aquelas bandas, em fotocópias.
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