05/11/10

"Liberta-te da pedra! Rebenta/ a caverna que te escraviza! Lança-te "

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"Cariátide"

Liberta-te da pedra! Rebenta
a caverna que te escraviza! Lança-te
extasiada pela campina! Escarnece das cornijas -
olha: pela barba do sileno ébrio,
do seu sangue eternamente fervilhante
sonoro único perpassado de ecos,
goteja vinho no seu sexo!

Cospe na colunomania: mãos senis
e tocadas da morte as ergueram tremendo
para céus sombrios. Desmorona
os templos ante a nostalgia do teu joelho
a apetecer a dança!

Estende-te, desabrocha, oh, cobre do sangue
de grandes feridas o teu canteiro macio:
olha, Vénus com as suas pombas engrinalda
de rosas as ancas, como porta do amor -
olha o último sopro azul deste verão
que sobre marés de sécias é levado
às longes margens castanhas de folhagem;
olha o dealbar desta última hora, voluptuosamente enganadora,
da nossa meridionalidade
abobadada.

Gottfried Benn in " A Alma e o Caos, 100 poemas expressionistas", Relógio D'Água Editores,
Lisboa, Lisboa, 2001, p 267 (Selecção e Tradução de João Barrento).
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