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"Bagatela para a mão esquerda"
Escrever com a mão esquerda
é tarefa bem ingrata.
Não seria empreendida
se não fosse estritamente
necessária.
A mão esquerda é mais dura,
mais austera, e desconfia
desses gestos estouvados
que a mão direita, impensada,
esbornia.
À mão esquerda é vedado
o recurso falso e fácil
de dispensar partitura,
a fraqueza (dita força)
do hábito.
Daí o jeito contido
das coisas que ela produz,
o ar desesperançado
de quem até nem precisa
vir à luz.
(No entanto, ela escreve coisas
da mais esconsa eloquência:
atropelar o sentido
ao contrapelo da pauta
é sua ciência.)
Paulo Henriques Britto In "Macau", Editora Schwarcz,
São Paulo, 2006, p 19.
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