19/11/09

"A Musa atormenta-se no impasse, instiga..."

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"Musas ( De Boecklin)"

I

Desce, crispa-se, rasga e conspurca, escorraça, perscruta,
Enraíza o pensar
(Encapelada, balbuciante, eclesiástica),
O sussurrar, o sossego da Musa aos pés do auctor, em fria laje, a arquejar,
Deixa-o à solidão, ao Beato.
(A proclamação ao Bem
É a cura do desatino.) Expira
A suprimir o aniquilamento do que o inspira.
Em tudo o que se escreve falta "o mais além".
A Musa com fuligem, o rosto de abcessos, obsessões,
No véu que não sendo de tule é de frieza.
Musa, as Musas,
Em cada injúria acena com a morte no
Mundo, o modelo eterno da atracção que acolhe as sete lágrimas
Na piedade ou na comiseração para vaguear
Entre os arbustos empoerados do
Jardim fechado em nuvens aparadas.
A Musa Conventual devassa o Pavilhão de Caça, seria melhor dizer,
Sodomita, deslumbrada pela "impunidade de outros".
Chagas emplumadas no nicho em que o penduraram escanzelado,
Não escapa à cobiça,
Não lhe convém, o Beato evoca a Moral ritmada.

II

Nas grinaldas versificadas
Busque-se mais enfeites de gesso, florzita.

A Musa atormenta-se no impasse, instiga, deixa-o ao acaso da indolência para que desvairado, a
ciciar, se mantenha sob influência. Noutra escala, gesto inofensivo, haverá elos de Consolação (de
Boécio) e de outras afinidades morais do
Problema. As variantes desregradas do praguejador de chifres atordoado pela irresolução.
A Musa melancólica persuade. Persuade? (A Crítica reluz a submeter o poeta que não persuade.)
A Musa no crepúsculo, empunha um ceptro empenado.
(As alusões a este assunto devem explicar o nome inspirador.)
E a Crítica ofensora ( a Musa, as Musas a farejar o gomil de belos ditos).
E o auctor desagradado, cuspinhando, tossindo,
"Tão vãmente", exausto, em certo sentido envolve-se
Na folia para fabular.

José Emílio-Nelson In "Bibliotheca Scatologica", Quasi Edições,
Vila Nova de Famalicão, 2007, pp 14 - 15.
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