11/08/11
" A salvação é uma ruína temerária, uma praia sem pegadas (...) "
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"Há uma lâmina reduzindo o mundo"
Neste lugar, para me salvar, basta olhar o céu.
O sono solitário da água queima-me as mãos, adormeço rodeado de árvores e pássaros.
Agora engano melhor o silêncio dos dias, as suas casas frágeis, alcanço o náufrago
iluminado, as velas da piedade amarram-me à escuridão da infância,
às sedas nocturnas do medo, à mortalha mais límpida dos relâmpagos
da névoa cortada pelos rápidos remos dos remadores.
A salvação é uma ruína temerária, uma praia sem pegadas, um furtivo
sorriso à escassez das pétalas esmagadas do quintal.
Há uma pureza no sol encantado que desenhavas com os seus raios muito firmes
e quentes, há uma lâmina reduzindo o mundo, manchando os cães com sangue,
expulsando as estrelas, a dardejante beleza das mulheres,
a formosa pele que à transparência da luz se expunha.
Agora, neste lugar, se eu pudesse, para me salvar, bastava olhar o céu.
Jorge Velhote in "Saudade - Revista de Poesia " Nº 1,
Dezembro, 2001, Direção de António José Queirós.
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