27/10/11

" Pedro e Inês estão vivos e caminham/ pelas ruas urbanas, são a imagem/ que salva da tristeza quem não vive "

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Daqueles que chegaram de Alcobaça
no autocarro que os trouxe, emudecidos,
de regresso à cidade e ao dia-a-dia,
em quantos se projectam Pedro e Inês?
Não é lenda, é um mito antigo, deuses
substitutos do amor que, humanos, se
foram mudando em deuses, lado a lado
com o Cristo da igreja, que também,
dizem, terá amado, e hoje é a cruz
do nosso tempo, casta e melancólica.
Nada é o que parece. Não se sabe
a vida dos divinos, a mais íntima,
a mais real, que foi e já não é,
quando uniam os corpos com furor.
Dos deuses tão-só isto atrai. Assim,
Pedro e Inês estão vivos e caminham
pelas ruas urbanas, são a imagem
que salva da tristeza quem não vive
como eles se entregaram: doidamente.

 Nuno Dempster in "Pedro e Inês: Dolce Stil Nuovo ", Edições Sempre-Em-Pé,
Águas Santas, 2011, p 30 "
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