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O espaço, lâmpada acinzentada e chuvosa, neste final
de estação. Ou talvez um enigma, aquém das sereias
a vicejar no rio, que logo se mistura com a sonolência
dos táxis, com o correr apavorado e sem destino
de quantos ainda o teimam - ameaçado e sem remédio.
A estação, por seu lado, é mero ponto no final
do espaço. Um mapa em tons de azul conspurcado
com seus bancos de jardim ( a despropósito),
seus jogos de partidas e chegadas, seu ronronar
de carruagens, de altifalantes, da máquina vermelha
dos refrigerantes a reflectir-se na vacilante
imobilidade dos placares. E é por aqui que (sempre)
nos cruzamos - alegoria de cruz e ramos;
de turbilhão e medo nas mais ácidas vésperas
em que cedo - meu silêncio... e espanto, neste poema
( nem estação nem canto ), tão-só lembrança,
tão-só imagem de um aprendiz secreto a vislumbrar
o longe, o verde, a intacta ferida, que atentamente
vai decifrando nesse aberto terraço onde se recusa
o banal e onde o sol é todo o espaço.
Victor Oliveira Mateus in Revista Letras Com Vida, Nº 4. Lisboa: CLEPUL da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 2º semestre 2011, p 211.
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