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Quando somos novos, toda a gente com mais de trinta anos parece de meia-idade, toda a gente com mais de cinquenta é antiga. E o tempo, à medida que passa, confirma que não estávamos assim tão enganados. Esses pequenos diferenciais etários, tão cruciais e flagrantes quando somos novos, desfazem-se. Acabamos por pertencer todos à mesma categoria, a dos não jovens. Nunca me importei muito com isso.
Mas há exceções à regra. Para algumas pessoas, os diferenciais de tempo irrefutáveis na juventude nunca desaparecem realmente: o idoso permanece idoso, mesmo quando são os dois velhotes e se babam. Para algumas pessoas um intervalo de, digamos, cinco meses significa que, perversamente, se verão sempre como mais sábios e mais bem informados do que o outro, por mais que o contrário seja evidente. Ou talvez porque o contrário é evidente. Porque é perfeitamente claro para qualquer observador imparcial que o equilíbrio se deslocou para a pessoa ligeiramente mais nova, a outra mantém a pretensão da superioridade ainda com mais rigor. Ainda mais neuroticamente.
Ah, é verdade, continuo a tocar muito Dvorak. Não tanto as sinfonias; hoje em dia prefiro os quartetos de cordas. Mas Tchaikovsky seguiu o caminho daqueles génios que fascinam na juventude e conservam uma força residual na meia-idade, mas mais tarde parecem, se não confrangedores, pelo menos irrelevantes. Não quero dizer com isto que ela tivesse razão. Não há mal nenhum em ser um génio que consegue fascinar os jovens. Mas há qualquer coisa de mal nos jovens que não se deixam fascinar por um génio. E, aliás, não acho que a banda sonora de Um Homem e Uma Mulher seja uma obra de génio. Já naquele tempo não achava. Por outro lado, lembro ocasionalmente Ted Hughes e sorrio pelo facto de, na verdade, ele nunca ter ficado sem animais.
Dou-me bem com Susie. Quer dizer, o suficiente. Mas a geração mais nova já não sente necessidade, nem sequer obrigação de manter o contacto. Pelo menos "manter contecto" que implique "ver". Para o pai, um email chega - pena ele não tenha aprendido a mandar mensagens pelo telemóvel. Sim, já está reformado, sempre às voltas com pesquisas e aquele "projetos" misteriosos dele, duvido que alguma vez chegue a terminar alguma coisa, mas pelo menos conserva o cérebro em atividade, é melhor do que o golfe, e sim, contávamos passar por lá na semana passada, mas surgiu um imprevisto.
Julian Barnes in " O Sentido do Fim ", Quetzal Editores, Lisboa, 2011, pp 66 - 68.
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