01/01/12

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Pareceu-me, naquele dia, no quarto de Quintana no Presbyterian, quando li as últimas provas do Nothing Lost, que talvez houvesse um erro gramatical na última frase da passagem sobre J. J. McClure, Teresa Kean e o tornado. Na verdade, nunca soube as regras da gramática, e em vez disso sempre confiei no que me soava bem, mas havia ali qualquer coisa que me parecia que não soava bem. A frase nessas últimas provas rezava assim: " Era o mais próximo uma declaração de amor que J. J. era capaz de fazer." Por mim, teria acrescentado uma preposição: " Era o mais próximo de uma declaração de amor que J. J. era capaz de fazer."
Sentei-me à janela e fiquei a ver os blocos de gelo no Hudson, pensando na frase. Era o mais próximo uma declaração de amor que J. J. era capaz de fazer. Não era o género de frase que, caso a tivéssemos escrito, gostássemos que estivesse errada, mas também não era o género de frase, se fosse assim que a tivéssemos escrito, que gostássemos de modificar. Como é que ele a teria escrito? Que tinha em mente? Como a queria? A decisão ficou para mim. Qualquer escolha minha acarretaria um potencial abandono, se não traição. Foi uma das razões por que estava a chorar no quarto de Quintana, no hospital. Nessa noite, quando voltei para o meu quarto, comparei com as provas anteriores e com os originais. O erro, se é que havia um erro, estava ali desde o princípio. Deixei ficar como estava.
Porque é que hás-de ter sempre razão.
Porque é que hás-de ter sempre a última palavra.
Ao menos uma vez na vida, deixa andar.
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  Joan Didion in " O Ano do Pensamento Mágico ", Gótica, Lisboa, 2006, pp 146 - 147.
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