09/04/08

Poetas

António Ramos Rosa, na Biblioteca Municipal D.Dinis (2007)

Celebração de um corpo


Quantos prodígios exactos nesse corpo
de simetrias ardentes, de redondas geometrias!
Lavrado pelo vento, modelado pelo fogo,
polido pela água, de incandescentes cimos,
de espumantes funduras sequiosas!
Dir-se-ia um ramo do esplendor o torso oblíquo
onde dois pequenos e redondos seios latejam.
Dir-se-ia um navio pela alta simetria
das suas pernas brancas. E que dizer do rosto?
Talvez três palavras: estrela, alma água.
Como o discurso da água é o ventre liso,
e o umbigo uma côncava conchinha preciosa.
No seu pequeno púbis a penugem é doirada
e leve, de um veludo quase azul.
Redondos e brancos como luas os joelhos,
e os delicados pés, amorosamente exactos,
quase minúsculos, mas sólidos e terrestres.
O vigor e a graça unem-se nesse corpo
sumptuoso e frágil, vegetal e límpido.
Que fulgurantes maravilhas, que jóias tão sedosas!
No amplexo o dorso é espesso como um barco
e as nádegas, quase opulentas, são redondas dunas
de uma flexível argila plenamente solar.
Que tesouros tão fluídos e que energia tão tensa,
que relâmpagos fulgurantes, que flores tão sólidas!

António Ramos Rosa, In "A Rosa Intacta"