28/10/10

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(Que fez o Autor a um capitão de
infantaria que o acharam fornicando
com uma negra)

"Décimas"


Ontem, senhor Capitão,
vos vi deitar a prancha,
e embarcar-vos numa lancha
de gentil navegação;
a lancha era um galeão,
que joga trinta por banda,
grande popa, alta varanda,
tão grande popa, que dar
podia o cu a beijar
à maior urca de Holanda.

Era tão azevichada,
tão luzente, e tão flamante,
que eu cri, que naquele instante
saiu do porto breada:
estava tão estancada,
que se escusava outra frágua,
e assim tive grande mágoa
da lancha, por ver que quando
a estáveis calafetando,
então fazia mais água.

Vós logo destes à bomba,
com tal pressa, e tal afinco,
que a pusestes como um brinco,
mais lisa, que uma pitomba.
Como a lancha era mazomba,
jogava tanto de quilha,
que tive por maravilha
não comê-la o mar salgado,
mas vós tínheis o cuidado
de lhe ir metendo a cavilha.

Desde então toda esta terra
vos fez por aclamação
capitão de guarnição
não só, mas de mar e guerra.
Eu sei, que o povo não erra,
nem nisso vos faz mercê,
porque sois soldado que
podeis capitanear
as charruas de além-mar,
se são urcas de Guiné.

Gregório de Matos in "Melhores Poemas" (Seleção e fixação de texto: Darcy Damasceno),
Global Editora, São Paulo, 2000, pp 141 - 142.
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