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01/06/13


 " Poemas Não São Para Serem Publicados "



Poemas não são para serem publicados
poemas são drag queens rolando piteiras em puteiros
ou somos nós, poetas velhos de caras borradas
poetas de cinco centavos

poemas não são para serem publicados

poemas são para serem escritos
às vezes rasgados
às vezes guardados
podem ser confessionais, imorais
de vanguarda
podem ser apenas voz humílima do guarda
podem ser uma criança

mas em geral
são sem esperança
de serem publicados

poemas custam caro
e não fazem o mesmo efeito de um chope
não fazem o efeito de um baseado
poemas não servem pra trepar nem nada

nem sequer tente publicar seus poemas
faça-os voltar calados às gavetas
com eles ninguém se meta

dormirão como dormem os drogados:
tristes, gelados, pesados
mas serão sempre únicos
sempre ineditamente
mediúnicos

sempre salvos das graças das prebendas
sempre coisas pudendas (ainda que sujos)

poemas, sempre úmidos
nocivos, fim de feira
maus de venda e de vida.

Não são nem mesmo um incentivo
à leitura, pois quem vai ler linhas quebradas
oriundas de almas idem?


  Pallottini, Renata. Um Calafrio Diário. São Paulo: Editora Perspectiva, 2002, pp 114 - 115.
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30/05/13

 
 
  " Tão triste como um terno azul-marinho... "
 
 
 
Tão triste como um terno azul-marinho
como coçar as costas numa árvore
razante de urubu
cio dos gatos
besouro virado de costas
 
planta que não pegou
piruá
rompimento
 
aquela tristeza de namoro na Internet
ir ao aeroporto
e não partir
 
triste como uma tarde de domingo
depois do jogo
ressaca de vinho-do-porto
porto
 
tão triste como ter amado
e agora perceber
que não era preciso
que foi inoportuno
que ninguém se importou
 
tão triste como um touro
na arena
lembrando o pasto
uma galinha humilde coberta pelo galo
 
triste como gaiola
triste como ser tolo
 
 
  Pallottini, Renata. Um Calafrio Diário. São Paulo: Editora Perspectiva, 2002, pp 94 - 95.
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  "  Algo  "


Mora dentro de mim
É a parte mais escura do meu sangue
Costela flutuante

É um pouco da medula que me dói
Esse ar que me falta
Nas horas de insônia
Tosse de madrugada
Sobressalto

E não se vai
Eu já lhe disse adeus e não se vai

Gosta de mim
Mas não me amou jamais.


   Pallottini, Renata. Um Calafrio Diário. São Paulo: Editora Perspectiva, 2002, p 64.
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08/05/10

"O que sempre doeu/ ainda dói. "

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"De repente a certeza..."

De repente a certeza
da extrema solidão.
Três amores (são quatro)
a vida e seus compassos
um canário e um cão.

Nada é meu, nunca foi.
O que sempre doeu
ainda dói.

Renata Pallottini in "Obra Poética", Editora Hucitec, São Paulo, 1995, 284.
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22/05/08




(Nota - não tenho, neste momento, nem o título
deste soneto, nem o nome do livro a que pertence,
mas mesmo assim...)

Hei de morrer em ti, nesse teu corpo estranho
Num espanto feroz, feito de febre e fúria,
Feliz pelo que tive, amante enquanto dure
A alta fonte do amor e seu limpo rebanho.

A tua alma assassina assistirá, contente,
A um sonho agonizante e por si só perdido
E, sonho do meu sonho, esse fim terá sido
Nada de verdadeiro, o falso de quem sente.

Morrerei nos teus olhos, morrerei nas memórias
Do teu mundo cabal, cadafalso de histórias,
Rupturas, padrões, fábulas, ossos, chifres.

Sentirás o meu peso, isso que não sentiste
Senão como um olhar, talvez mau, talvez triste.
Serei por fim em ti, para que me decifres.

Renata Pallottini




    "Atira para o mar"


Atira para o mar as tuas coisas
abandona os teus pais
muda de nome

esquece a pátria
parte sem bagagem
fica mudo e ensurdece
abre os teus olhos

Se o teu amor não vale tudo isso
então fica onde estás
gelado e quieto.

O amor só sabe ir de mãos vazias
e só vale se for
o único projeto.

Pallottini, Renata. Um Calafrio Diário. São Paulo: Editora Perspectiva, 2002, p 79.
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