.
.
"Poema II de Três Epifanias Triviais"
As coisas que te cercam, até onde
alcança a tua vista, tão passivas
em sua opacidade, que te impedem
de enxergar o (inexistente) horizonte,
que justamente por não serem vivas
se prestam para tudo, e nunca pedem
nem mesmo uma migalha de atenção,
essas coisas que você usa e esquece
assim que larga na primeira mesa -
pois bem: elas vão ficar. Você, não.
Tudo que pensa passa. Permanece
a alvenaria do mundo, o que pesa.
O mais é enchimento, e se consome.
As tais Formas eternas, as Idéias,
e a mente que as inventa, acabam em pó,
e delas ficam, quando muito, os nomes.
Muita louça ainda resta de Pompéia,
mas lábios que a tocaram, nem um só.
As testemunhas cegas da existência,
sempre a te olhar sem que você se importe,
vão assistir sem compaixão nem ânsia,
com a mais absoluta indiferença,
quando chegar a hora, a tua morte.
(Não que isso tenha a mínima importância.)
Paulo Henriques Britto In "Macau", Editora Schwarcz,
São Paulo, 2006, pp 70 - 71.
.
.
Mostrar mensagens com a etiqueta Paulo Henriques Britto. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Paulo Henriques Britto. Mostrar todas as mensagens
26/11/09
.
.
"Bagatela para a mão esquerda"
Escrever com a mão esquerda
é tarefa bem ingrata.
Não seria empreendida
se não fosse estritamente
necessária.
A mão esquerda é mais dura,
mais austera, e desconfia
desses gestos estouvados
que a mão direita, impensada,
esbornia.
À mão esquerda é vedado
o recurso falso e fácil
de dispensar partitura,
a fraqueza (dita força)
do hábito.
Daí o jeito contido
das coisas que ela produz,
o ar desesperançado
de quem até nem precisa
vir à luz.
(No entanto, ela escreve coisas
da mais esconsa eloquência:
atropelar o sentido
ao contrapelo da pauta
é sua ciência.)
Paulo Henriques Britto In "Macau", Editora Schwarcz,
São Paulo, 2006, p 19.
.
.
.
"Bagatela para a mão esquerda"
Escrever com a mão esquerda
é tarefa bem ingrata.
Não seria empreendida
se não fosse estritamente
necessária.
A mão esquerda é mais dura,
mais austera, e desconfia
desses gestos estouvados
que a mão direita, impensada,
esbornia.
À mão esquerda é vedado
o recurso falso e fácil
de dispensar partitura,
a fraqueza (dita força)
do hábito.
Daí o jeito contido
das coisas que ela produz,
o ar desesperançado
de quem até nem precisa
vir à luz.
(No entanto, ela escreve coisas
da mais esconsa eloquência:
atropelar o sentido
ao contrapelo da pauta
é sua ciência.)
Paulo Henriques Britto In "Macau", Editora Schwarcz,
São Paulo, 2006, p 19.
.
.
Subscrever:
Mensagens (Atom)