Mostrar mensagens com a etiqueta Mario Benedetti. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Mario Benedetti. Mostrar todas as mensagens

18/05/09




           "Atlântico"


Sempre que atravesso o oceano
suspeito que algo se abre na distância
quando cruzo o crepúsculo sem pássaros
é como se começasse a viver de novo
mas uma vida outra/ desprendida
de um passado até agora inexplicável

clemências e longínquas efusões
assomam implacáveis na massa de nuvens
talvez para medir o meu esboço de infinito
e há pobres abalos de uma verdade a toda a prova
um rufar de tambores que perturbaram o descanso
marcas de esperanças ou de tédio

por isso sempre que atravesso o oceano
os ouvidos isolam-me/ a memória zumbe
as hospedeiras oferecem o seu sorriso estudado
e o piloto encarrega-se da minha alma
é como se morresse por instantes
mas uma morte nova/ em equilíbrio


Mario Benedetti In "O Mar na Poesia da América Latina",
Assírio & Alvim, Lisboa, 1999, p 385 (Organização de Isabel
Aguiar Barcelos e Tradução de José Agostinho Baptista).
.
.

18/05/08


.
.
              "La Mendiga"
.

La mendiga bajaba siempre a la misma hora y se situaba
en el mismo tramo de la escalinata, con la misma enigmática
expresión de filósofo del siglo diecinueve. Como era habitual,
colocaba frente a ella su platillo de porcelana de Sèvres pero
no pedía nada a los viandantes. Tampoco tocaba quena ni
violín, o sea que no desafinaba brutalmente como los otros
mendigos de la zona.
A veces abría su bolsón de lona remendada y extraía algún
libro de Holderlin o de Kierkegaard o de Hegel y se concentraba
en su lectura sin gafas.
Curiosamente, los que pasaban le iban dejando monedas o
billetes y hasta algún cheque al portador, no se sabe si en
reconocimento a su afinado silencio o sencillamente porque
comprendían que la pobre se había equivocado de época.

Mario Benedetti, In "La Vida ese Paréntesis"