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13/08/13

 
 
       "  Soneto patético  "
 
 
Acordo para um mundo novo no jornal.
Notícias junto ao hálito acre da manhã.
Espreguiçadamente explode a realidade.
O sonho se desfaz nas cores do papel.
 
Refaço o mundo no exercício matinal.
Lavo os dentes, sorrio, a vida fica sã.
Precipito-me às ruas e ganho a cidade.
No trabalho, o refúgio. Da paz desce o véu.
 
As horas vão... A tarde cinza fica escura.
O dia chega compassadamente ao fim.
A vida, que gritava, agora só murmura.
 
Tranco-me em casa. O mundo sangra na TV.
O sangue do meu sangue esvai-se, durmo enfim.
E não sei quem te viu. E não sei quem me vê.
 
 
  Ramos, Luís Antonio Cajazeira. Mais que sempre. Rio de Janeiro: 7Letras, 2007, p 127.
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  "  O amor de minha vida  "

Eu, com certeza, gosto é de foder.
Até digo que sei o quanto amar
seja lá o que for tem seu lugar,
mas foder por foder é mais prazer.

Amo a só superfície que há na pele,
a visão de uma boca subjugada,
apascentar um cu, gozar em cada
posição que a libido me revele.

O pau, que é sempre alerta, um dia cansa;
e o que fervia o sangue na cabeça
esfria o cavernoso da lembrança.

Resta-me, então, foder aqui e agora.
Portanto, perdição, goze e me esqueça.
Eu sou o amor que pica e vai embora.


  Ramos, Luís Antonio Cajazeira. Mais que sempre. Rio de Janeiro: 7Letras, 2007, p 79.
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    " Teu "

Quando te alcanço o olhar e te vejo medusa,
lanças-me cobras e lagartos; colho sapos.
Que me importa? És a musa! E sou um teu capacho,
tão-só um troço a mais no caldeirão da bruxa.

Petrificado, atiro-me a teus pés de pedra.
Tua lava ferina corta as cicatrizes
da minha lama. Derretido nas raízes,
restam-me cinzas de te amar tua alma cega.

Que Cupido canhestro errou flechar meu peito
fraco tão forte! O coice lesa-me de vez
o calcanhar de Aquiles. Dói-me o cotovelo.

Mas a alvura do gelo desce em tua tez
de esfinge e de montanha e me acalma de um jeito...
Se é terrível te amar? Tanto faz (que já fez).


   Ramos, Luís Antonio Cajazeira. Mais que sempre. Rio de Janeiro: 7Letras, 2007, p 51.
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    " Licença poética "


Sou livre pra buscar a rosa azul,
sou livre pra tocar fogo no lar,
livre pra qualquer droga, pra tomar
na veia, livre pra tomar no cu.

À minha volta o mundo é meu ensaio,
um palco, um tiro-ao-alvo, um lenço branco
em que beijo o sorriso ou cuspo o pranto,
ao bel-prazer do arbítrio, e me distraio.

Por onde começar? Mirando o céu?
Atirando no breu? Tirando o véu?
Condenado a ser livre! Como um biltre,

faço um soneto vil, sem peripécia,
que termina do jeito que começa.
Sou livre. Irremediavelmente livre.


   Ramos, Luís Antonio Cajazeira. Mais que sempre. Rio de Janeiro: 7Letras, 2007, p 45.
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