30/11/11

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Em frente,
a igreja parecia de uma brancura nova,
imaculada.
Os ciprestes eram como longos braços erguidos.
Numa única lápide, li um epitáfio com duas rosas.
Um cão ladrou e, como uma dor que se reabrisse,
lembrei-me de ti,
e deixei que voltassem a correr as lágrimas.
Estava só,
estaria sempre só.
O peso do mundo era irremediável.
Por mais que quisesse não podia esquecer-te,
não podia esquecer nada.
Matei o dragão, disseram-me, e ao matá-lo, matei as
minhas tardes de pólen.
Arrefeci tremendamente.
Uma corrente gélida varreu as serras.
As uvas eram amargas.
Não foi isto o que pedi, ao desembocar no túnel,
à entrada da aldeia.
Pedi,
com desmesurada fé,
que nunca partissem aqueles que em mim me
habitavam,
antes de o bolor revestir as paredes,
caíadas por fora.
Pedi que estivesses aqui,
sabendo que nunca mais te sentarias comigo,
junto ao limoeiro,
a ladrar aos frutos que caíam,
depois da geada.
...  ...  ...  ...  ...  ...

 José Agostinho Baptista in " Caminharei pelo Vale da Sombra ", Assírio & Alvim,
Lisboa, 2011, pp 110 - 112.
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