26/10/08




Opto pela visão do desejo
quando te espero no térreo jardim da manhã.
A viagem inscreve na cabeça
a magia da encruzilhada.
O resplendor da lua promete
neste encontro o brilho do fascínio,
alguns despojos breves na folha de papel,
a alma, o sortilégio,
a divina confluência dos rios que iluminam
o júbilo e a sombra da existência.
Sinto esta cidade densamente povoada
de ocres e azuis,
as árvores inclinam-se para o princípio do mundo,
a música que passa é essa transparência
de um enigma vivo,
a luz fragílima de um sentido brutal,
anterior a nós.
O verde ao longe é a solidão do mundo,
o feitiço das ruas esse fogo perpétuo,
a rosa nos teus olhos o augúrio da água
de que nascem as fontes e se incendeia a terra.
Pelo destino do mar regresso a esta pedra,
sob a sombra das aves celebro o sol e a lua,
nesta cidade me perco e me encontro,
novilho da impaciência e da carícia.


Amadeu Baptista, In "Arte do Regresso",
Campo das Letras Editores, Porto, 1999, pp. 22-23.
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