16/04/11

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e começou por ser sal. apenas. que se vai polindo no abraço como
estalos ou uivos. emudecido e túrgido. o mesmo sal que se deita à
terra para desfazer o gelo. o mesmo saber do branco sem mácula.
já não digo porcelana nem altar. não entenderias o excesso nem a
dança dos breves momentos em que a diferença é colheita e logo
lagar. não disse lago. de noite as casas são de cal e mudam de lugar.
digo agora mudam de lago. para unir o ofício de cerzir páginas e
janelas. portas e insónias. que o branco é enchente. e da ironia da
forma reflexiva digo que sou antes do profano. tu dirias do sagrado.
mas sou infecunda e múltipla. oculta e breve na instância das evi-
dências. __________________ arcanjo matinal moura e oceano.
e se fores vendaval faz-me maçã. ampara-me este sal. delito de ser
casa sem lugar.

 Isabel Mendes Ferreira in "As Lágrimas Estão Todas na Garganta do Mar",
Arcádia, Lisboa, 2010, p 392.
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