05/03/11

"desço para encontrar nos escombros/ uma faixa de terra/ para alimentar o segredo."


a luz atravessa o sangue, a memória.
mastiga este canto na cidade.
o incêndio devasta o interior da porta.
fragmenta estes olhos, entre o friso e a fogueira.
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a melodia prende a angústia e o mistério.
prendo no olhar as mãos que apagam
a melodia desta chuva.
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devagar, leio o sangue e a saliva
correndo ao canto da boca.
o livro rasga a língua, a garganta -
o canto (dos lábios) nos intervalos do silêncio.
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o frio, dizes, transmite à nascente
um pouco de morte, a nascente
deixa cair sobre nós esse incêndio.
o lume avança. enruga a pele,
queima os cabelos, os ossos - a alma.
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escrevo sobre o areal.
desço para encontrar nos escombros
uma faixa de terra
para alimentar o segredo.
nada vislumbro.
desfaço o teu corpo
.
em ruínas
a noite prevalece.
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Ruy Ventura in "Chave de ignição", Editora Labirinto, Fafe, 2009, p 20.
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