16/01/10

Inéditos - VIII

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"Miragem"



para Olga Savary



Chegou, impressentida e silenciosa,
com uma saudade eslava nos cabelos
e um ritmo de crepúsculo ou de rosa.


Os olhos eram suaves, e eis que ao vê-los,
outra paisagem, fluida, na distância,
sugeria doçuras e desvelos.


No coração, agora já sem ânsia,
paira a serenidade comovida
que lembra os puros cânticos da infância.


Logo depois se foi, mas refletida
nesse espelho interior, onde as imagens
se libertam do tempo, além da vida,


Olenka permanece, entre miragens.


(Rio de Janeiro, 1955)



Carlos Drummond de Andrade (Inédito)


Nota - em quatro linhas de rodapé, escritas pelo próprio punho,
Olga Savary esclarece-me alguns aspectos deste texto, dos quais
apenas um interessa agora: Olenka é um diminutivo eslavo; alusão
ao facto dos avós da poeta serem de origem russa.
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