26/12/11

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Todavia, a verdadeira medida da aptidão de Bruno para pertencer às SS prendia-se com o que podia oferecer-lhes. Ele teve pouca dificuldade em convencê-los de que era um candidato mais forte do que a média. As suas opiniões políticas são louvadas vezes sem conta por serem uberzeugt - convincentes, um nazi convicto. No entanto, a palavra que surge inesperadamente não é ideologia, nem sequer política. É a muito maior Weltanschauung, ou visão do mundo, algo mais lato e profundo que um simples manifesto político específico. Isto vai muito para além de uma mera preocupação, ou até de um conjunto de opiniões; o nacional-socialismo era uma ideologia que procurava abarcar todos os aspectos da vida alemã, desde as suas opiniões sobre a Humanidade até à justificação do seu futuro império. Os seus avaliadores nazis não estavam apenas a investigá-lo à procura de provas de fiabilidade política; estavam a testá-lo para saber até que ponto ele contribuiria para o principal objetivo do SD, que era pegar nessa visão do mundo e usá-la como um modelo a partir do qual se construiria uma nova Alemanha.
(...) A geração seguinte, a da minha mãe e das suas irmãs, desempenhou o seu papel neste processo de dissimulação e negação. Sabiam que não deviam fazer perguntas impertinentes e foi-lhes incutido que nunca conseguiriam compreender o que tinha estado em causa. De uma maneira geral, aceitaram isso. Acima de tudo, por vergonha. Não apenas pelo que ele pode ou não ter feito. Foi mais profundo do que isso. Foi uma reação contra o facto mais óbvio sobre o passado de Bruno, repulsa pelo facto de ele e milhares como ele terem aparentemente adorado ser nazis e terem parecido apreciar cada parte da ideologia, incluindo o antissemitismo que a alimentou. Uma vez, perguntei à minha mãe:
- Sentiu que estava a viver numa família importante?
- Oh, sim - respondeu ela. - O papá era um homem importante.
O nacional-socialismo foi uma política destinada a gratificar aspirações e frustrações íntimas, e tinha formado, aperfeiçoado e justificado claramente todas as opiniões mais importantes de Bruno. A sua integração no nazismo tinha sido um processo longo e complicado, começando como uma reação à catástrofe da Primeira Guerra Mundial e continuando a evoluir até 1945. Lutar por ele tinha sido o maior privilégio da sua carreira. Foi isso que a família tanto quis evitar que fosse lembrado. Tinham razão. Tinham passado anos a desmantelar, e a ignorar, a vida ativa de Bruno enquanto nazi. Agora eu ia nazificá-lo de novo, e não seria uma experiência fácil.
A única coisa que eu tinha para continuar era uma maço de papéis, datas e formulários que juntos, constituíam a espinha dorsal de uma carreira nazi. (...) Ele tinha sido um soldado de assalto, um lutador de rua, um ideólogo, um político intelectual, um guerreiro biológico, um acólito, um soldado, um delator, um fantasma, um burocrata, um árbitro de política social - em suma, o perfeito nazi.
(...) Comecei a perceber que descobrir mais acerca do meu avô significaria descobrir mais acerca do Terceiro Reich.

  Martin Davidson in " O Perfeito Nazi ", Texto Editores, Alfragide, 2011, pp 61 - 64.
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